ALOCUÇÃO
DE SUA EXCELÊNCIA O PRIMEIRO-MINISTRO DA
REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE
KAY RALA XANANA GUSMÃO
SESSÃO DE ABERTURA DA CONFERÊNCIA “10 ANOS DEPOIS: O CONTRIBUTO DOS PROGRAMAS SOCIAIS NA CONSTRUÇÃO DO ESTADO SOCIAL EM TIMOR-LESTE”
Excelências
Caros Convidados
Senhoras e Senhores,
Em primeiro lugar, não posso deixar de congratular a Senhora Ministra da Solidariedade Social, e a sua equipa, pela excelente iniciativa de organizarem uma Conferência sobre o contributo dos programas sociais na construção de um Estado Social, um tema que é de toda a importância para Timor-Leste.
Foi há relativamente pouco tempo que conquistámos a nossa Soberania e Independência Nacional. Foi há apenas doze anos que encerrámos um período trágico da nossa história, durante o qual se perderam muitas vidas e que, de uma forma geral, deixou marcas profundas na nossa sociedade.
O período de guerra que atravessámos no passado recente, apesar de ter afirmado a dignidade e o espírito dos timorenses, deixou muitas viúvas, órfãos, deficientes e, também, veteranos e idosos que consagraram a sua vida à causa da libertação nacional, que, hoje, são pobres, porque nunca tiveram a oportunidade de lutar por uma vida melhor, para eles próprios e para as suas famílias.
É exactamente por esta razão que Timor-Leste nunca, em circunstância alguma, poderia formar um Estado que não fosse um Estado Social!
Senhoras e senhores,
Nesta última década, apesar desta carga tão pesada que herdámos, e de termos arrancado sem infra estruturas básicas, sem capital humano qualificado, sem recursos financeiros próprios, sem instituições democráticas e, digo mesmo, sem qualquer tipo de memória institucional, conseguimos construir um
Estado Democrático e consolidar a Nação Timorense!
Em apenas dez anos temos motivos para nos orgulhar dos progressos consideráveis que alcançámos em várias frentes – politicamente, socialmente, economicamente e diplomaticamente. Apesar de alguns retrocessos e falhas graves, durante este período de construção do Estado nunca rejeitámos um
desafio, nunca desistimos de tentar fazer melhor e temos, pouco a pouco, de forma resiliente, vindo a aprender e a crescer enquanto Nação.
Aprendemos com o nosso Povo que os momentos difíceis têm que ser ultrapassados com coesão, envolvendo todos – o Estado, a Igreja, as ONGs, o sector privado e a Sociedade Civil no seu todo. A essência da construção de um Estado Social em Timor-Leste passa, necessariamente, por uma forte
componente de participação democrática para encontrar soluções para a inclusão social e para a protecção dos mais vulneráveis.
Na prossecução da missão de desenvolvimento nacional, o Governo encara as políticas de protecção social como uma prioridade.
À medida que temos vindo a crescer economicamente, e também graças à nossa reserva de recursos naturais, temos que distribuir a nossa riqueza por aqueles que mais necessitam.
Trata-se de dar dignidade àqueles que nos deram a liberdade.
Trata-se de proteger as famílias timorenses que ainda vivem no limiar da pobreza.
Trata-se de dar resposta a situações de emergência humanitária, já também temos que enfrentar os efeitos da mudança climática global ou, como infelizmente aconteceu em 2006, porque saídos de uma situação pós-conflito, teve-se que adoptar uma política de recuperação em grande escala.
Os programas de protecção social implementados pelo Ministério da Solidariedade Social têm sido fundamentais para alcançar estes objectivos.
Os programas sociais têm, nesta fase ainda inicial de construção do País, aliviado a pobreza extrema de um sector fraco da nossa população e protegido os mais vulneráveis. Têm também, ainda que de forma muito modesta, contribuído para dinamizar a economia, já que ao apoiar as redes familiares, estamos a criar oportunidades de empreendedorismo que têm levado à abertura de pequenos negócios por todo o País.
Excelências
Senhoras e senhores,
Para construirmos um verdadeiro Estado Social, temos que reforçar ainda mais as políticas do Governo dirigidas aos mais pobres. Não só através da continuação de apoio social aos grupos mais vulneráveis, de onde destaco os idosos, mulheres, crianças em risco e os incapacitados, mas também através da
construção de uma base sólida de Protecção Social, ajustada à nossa realidade demográfica, económica e administrativa, jurídica, social e cultural.
Para que isto aconteça estamos a desenvolver uma base legal adequada e mecanismos eficientes, em que se exige responsabilidade aos cidadãos timorenses mas também se oferecem diferentes opções. Neste aspecto, não podemos deixar de ponderar o factor da sustentabilidade do sistema, pois temos que nos precaver dos impactos a médio e longo prazo.
Entendemos que construir um Estado Social, um Estado solidário que valoriza a cidadania, não é transformar a nossa sociedade em duas classes: a dos pedintes e a dos contribuintes!
O Estado Social não é um Estado que faz caridade mas antes um Estado que intervém na sociedade, desenvolvendo sistemas de protecção social para garantir a protecção individual, ao mesmo tempo que cria as condições necessárias para que os mais pobres sejam os agentes de estratégias de dignidade para a saída da pobreza.
Para tal é premente uma profunda avaliação conjunta das possíveis soluções para as desigualdades sociais e o envolvimento directo das pessoas carenciadas na procura da saída da pobreza, envolvendo-as nas escolhas dos caminhos a fazer em direcção à prosperidade, numa atitude participativa e responsável da vivência em sociedade.
A participação e a contribuição de todos contra a tragédia da pobreza são os fundamentos de uma cultura democrática. Só com uma atitude colectiva de responsabilização e sentido de cidadania, conseguiremos desenvolver o País em termos económicos, sociais e humanos.
Os princípios gerais que Timor-Leste pretende seguir são básicos e penso que universais:
• Acesso por parte de todos os cidadãos à protecção social;
• Princípio da igualdade e da não-discriminação;
• Princípio da equidade, para um tratamento igual em situações iguais e um tratamento diferenciado em situações desiguais;
• Princípio de complementaridade, nas políticas desenvolvidas pelo Estado e nas acções desenvolvidas em parceria com a Sociedade
Civil;
• E, finalmente, a inserção social, combatendo as causas da marginalização e da exclusão social e promovendo a capacidade das próprias pessoas para se integrarem numa vida social activa.
Temos, na sequência deste último ponto, que começar também a dar mais atenção aos nossos jovens que, fruto de um legado de violência e desconfiança, podem não ter assimilado os genuínos valores de cidadania. Além disso, encontrando na sua vida quase adulta as adversidades do desemprego e da desocupação, podem, facilmente, entrar em situação de risco.
É neste sentido que digo que a construção de um Estado Social é um tema bastante complexo, sendo que as políticas sociais têm que estar estrategicamente integradas a outras políticas sectoriais de desenvolvimento.
Excelências
Senhoras e senhores,
Espero que no decorrer desta Conferência surjam soluções viáveis para a construção de um Estado Social. Apelo para uma reflexão conjunta sobre as formas mais adequadas para o fazer, para melhor avaliar, para aplicar as lições aprendidas e não repetir eventuais erros cometidos, para reforçar os programas
implementados e, mesmo, para esboçar novos programas.
No Plano Estratégico de Desenvolvimento 2011-2030, traçámos algumas estratégias e acções para o futuro, reconhecendo que a: “A verdadeira riqueza de qualquer Nação é a força do seu povo. A maximização da saúde, educação e qualidade de vida gerais do povo timorense são essenciais para se conseguir uma Nação justa e desenvolvida”. Esta é, para mim, a definição de um Estado Social, esta é a visão que tenho e, acredito todos vós tendes, para Timor-Leste.
Este compromisso coloca muitos desafios financeiros, sociais e culturais, mas todos sabemos que um dos aspectos de uma Nação forte, coesa e progressiva, é a capacidade de proteger os direitos e os interesses dos seus cidadãos mais vulneráveis.
Para terminar, senhoras e senhores, não posso deixar de agradecer àqueles que vieram de longe para participar nesta conferência e dar os seus contributos para o desenvolvimento de um Sistema de Protecção Social justo e adequado à nossa sociedade.
Em matéria de solidariedade internacional, temos tido a sorte de poder contar sempre com a ajuda desinteressada de vários países e cidadãos de todo o mundo. Enquanto recipientes de doação internacional, nestes últimos dez anos, temos ainda maior obrigação de aplicar em Timor-Leste sistemas verdadeiramente eficazes de protecção social e ajuda ao desenvolvimento individual dos cidadãos timorenses.
Se falharmos em termos de atribuir melhores condições de vida a Todos os timorenses, falhámos no nosso ideal de Independência.
Muito obrigado.
Kay Rala Xanana Gusmão
16 de Fevereiro de 2012